‘Diálogos pelo Clima’ discute inovações do MP em ações por Unidades de Conservação

Iniciativas que vão da comunicação capilarizada em redes à redivisão territorial jurídica para a preservação legal das unidades de conservação são alguns dos assuntos a serem abordados no terceiro encontro online do ciclo Diálogos pelo Clima, em 16 de agosto, às 19h. 

Promovido pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), o evento reúne o procurador da República Leandro Mitidieri, Coordenador do Grupo de Trabalho Unidades de Conservação do Ministério Público Federal; a promotora de Justiça do Estado da Bahia Cristina Seixas Graça (foto, à esq.), presidente da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) no biênio 2019-2021; e a bióloga Mariana Napolitano, gerente de Ciências da WWF-Brasil (World Wide Fund for Nature Brasil).

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Sob o tema “PADDD na Amazônia e no Cerrado: como as obrigações e responsabilidades legais podem minimizar o impacto desse processo?“, os participantes expõem medidas atuais no combate ao PADDD – sigla para “Protected Areas Downsizing, Downgrading and Degazetting” (“Redução, Recategorização e Extinção de Áreas Protegidas”).

Eles também apontam a necessidade de ampliar o combate, avaliam medidas eficazes e reforçam dados positivos conquistados, como por exemplo, vitória na Justiça pela manutenção integral do Parque Nacional de Itatiaia, no interior do estado do Rio de Janeiro.

O PADDD é um fenômeno que tem sido verificado não só no Brasil. A organização Conservação Internacional (CI) documentou recentemente mais de 3 mil casos decretados em quase 70 países, em uma área impactada do tamanho do Peru – ou da África do Sul.

As ações de PADDD abrangem mudanças legais e regulamentares que impactam as áreas protegidas por relaxamento das regras sobre o uso de recursos, reduzem os limites físicos ou mesmo buscam eliminar totalmente as áreas protegidas.

No Brasil, o WWF registrou nos últimos anos cerca de 90 eventos de PADDD, que abrangem cerca de 110 mil km² – em geral, visando a reduzir o status de proteção das áreas protegidas.  Dentre esses números, 61 unidades de conservação na Amazônia estão entre as mais ameaçadas – a maioria localizada no Pará (22 UCs) e Amazonas (25 UCs). Em valores proporcionais, destaca-se também o Maranhão, que apresenta 38% das 13 UCs ameaçadas, especialmente por desmatamento e projetos ferroviários.

Os ataques não se restringem apenas a essas regiões, e mostram a importância da mobilização, capilarizada através de redes e influenciadores digitais, como a Rede Pró-UC (Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação).

Em 2021, a organização liderou campanha contra projeto de lei para reabrir uma estrada ilegal dentro do Parque Nacional do Iguaçu, em Foz do Iguaçu, no Paraná. A Estrada do Colono, aberta ilegalmente em 1955 foi fechada na década de 2000 por decisão judicial. O Ministério Público Federal destaca como inconstitucional o projeto de reabertura da estrada dentro do Parque, inclusive com sentença do Supremo Tribunal Federal que a impede.

MP se fortalece em inovações territoriais 

Dois modelos de redivisão prometem tornar mais eficiente o trabalho dos procuradores e promotores de Justiça em estados que têm parte de seus territórios no Cerrado. O Ministério Público do Estado de Minas Gerais, por exemplo, desenvolveu uma gestão territorial por bacia hidrográfica. Para tal, o MPMG criou coordenadorias regionais vinculadas às áreas dessas bacias, orientando a atuação institucional conforme a territorialidade e perfil ambiental e hidrográfico das regiões.

Na divisão tradicional, as coordenadorias do MP ficavam vinculadas às comarcas – as quais nem sempre correspondiam às bacias hidrográficas. Este entrave dificultava o andamento das ações, já que uma questão referente a uma bacia, com frequência, se dividia entre comarcas diferentes. A nova gestão territorial permite ligar cada ação à região hidrográfica por completo – ao menos no que compete ao MP.

Por sua vez, o Ministério Público do Estado da Bahia divide promotores em núcleos de defesa da Mata Atlântica e dos rios Paraguaçu e São Francisco. Os promotores são efetivos desses núcleos, o que evita sua transferência por pressões políticas ou econômicas, e aumenta a viabilidade de sua atuação.

Em julho, o MPBA lançou o projeto “Biomas da Bahia’, visando a fomentar a criação de novas unidades de Reserva Particular do Patrimônio Natural para os três biomas do estado – Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica. A próxima inovação, em início de discussão, é incluir as variáveis climáticas como regra de licenciamento ambiental

Recordes de visitações em unidades protegidas

O respeito à preservação vem despertando grande interesse da população em geral e também nos tribunais, com forte atuação do Ministério Público, quanto nos recordes seguidos de visitação a parques, reservas e áreas de proteção, conforme as regras, demonstrando seu respaldo crescente junto à sociedade.

Em 2021, mesmo com a mobilidade em espaços públicos ainda afetada pela pandemia da Covid-19, dez unidades federais de conservação bateram recordes de visitação, com 6,9 milhões de pessoas, de acordo com dados do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

“A maior busca por visitação e uso público de unidades protegidas mostra que as pessoas se interessam por conhecer as áreas preservadas, respeitando suas regras”, ressalta Mariana Napolitano, gerente de Ciências do WWF-Brasil. E completa: “A conservação, portanto, não é um entrave ao progresso econômico, como certo senso comum costumava alegar. Pelo contrário, a manutenção dessas unidades contribui positivamente para o progresso de atividades econômicas ligadas ao turismo ecológico e setores correlatos”.

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A bióloga foi uma das principais responsáveis pelas publicações “PADD em Unidades de Conservação na Amazônia” e “Redução, Recategorização e Extinção de Unidades de Conservação no Cerrado”, lançadas, respectivamente, em 2019 e 2020, pelo WWF-Brasil.

Na linha desses estudos, Mariana aponta três vetores para manter a ampliar as unidades de conservação no Brasil. “Primeiro, é preciso trabalhar com base em indicadores para seguir metas de longo prazo na consolidação das unidades, estabelecer planos a serem seguidos. Então, com as unidades consolidadas, saber como gerar benefícios, implantando planos de manejo que reconheçam uso público com interação da comunidade e fazer a devida regularização fundiária, incluindo eventuais compensações. Por fim, o uso desses indicadores para a fiscalização efetiva, a fim de proteger as unidades contra invasões e desmatamentos, como vem sendo feito, em diversas ações, o Ministério Público”.

Justiça mantém proteção integral em Itatiaia

Com recurso já no Superior Tribunal de Justiça (STJ), uma dessas ações é apontada como essencial para a manutenção das unidades por outro palestrante dos Diálogos pelo Clima, o procurador Leandro Mitidieri. A ação envolve não apenas uma das unidades federais que, juntas, bateram o recorde de visitação no ano passado, como a mais antiga de todas, o Parque Nacional de Itatiaia (PNI), fundado em 1937, no sul do estado do Rio de Janeiro.

Nas instâncias anteriores, o Ministério Público Federal teve ganho de causa contra proprietários de casas que ficam dentro do parque – uma área de proteção integral, que, portanto, não permite construções em seu interior.

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“Eles alegam a caducidade da lei de criação do parque e do decreto que o regulamentou”, resume Mitidieri. “Acontece que isso se aplicaria a todo o regulamento do parque e, então, não pode ter plano de manejo… nada. Põe em risco o próprio parque, por ‘morte indireta’, e abre precedente para todas as unidades de conservação”, avalia o procurador, ressaltando a vitória que o MPF vem tendo, até aqui. A ação pode ir até o STF.

Ciclo de instrumentos pelas metas climáticas

O ciclo Diálogos pelo Clima iniciou no dia 14 de junho e ocorre uma vez por mês, sempre em encontros online. Os debates buscam criar entendimento jurídico e de novos arranjos institucionais que permitam o combate ao desmatamento e o enfrentamento às mudanças climáticas, com especial enfoque na Amazônia e no Cerrado.

São diferentes temas, que envolvem aspectos econômicos, legais e instrumentos de execução. A programação vai até novembro. Para assistir e participar, basta se inscrever pelo site https://www.copaibas-dialogospeloclima.com.br/

O ciclo faz parte do Programa COPAÍBAS – Comunidades Tradicionais, Povos Indígenas e Áreas Protegidas nos biomas Amazônia e Cerrado –, com o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO) como gestor técnico e financeiro e a Iniciativa Internacional da Noruega pelo Clima e Florestas (NICFI), como financiadora.  Confira os próximos encontros:

13 de setembro – “Mensuração do dano ambiental no âmbito das mudanças climáticas”
Ana Carolina Haliuc Bragança 
– Procuradora da República no Amazonas, especialista em Direito Ambiental pela UFPR

Carlos Eduardo Young – Professor Titular do Instituto de Economia da UFRJ, onde coordena o Grupo de Economia do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (GEMA/IE/UFRJ)

 

18 de outubro – “Alternativas econômicas diante dos desafios territoriais”

Rafael da Silva Rocha – Procurador da República no Amazonas, coordenador do GT Amazônia Legal e do projeto MPF na Comunidade

Eliane Moreira – Promotora de justiça do Ministério Público do Estado do Pará, diretora acadêmica Norte da Escola Superior da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa)

Karen Oliveira – Geóloga, mestre em Planejamento Energético Ambiental (Coppe-UFRJ), doutora em Relações Internacionais (PUC-RJ), diretora para Políticas Públicas e Relações Governamentais da The Nature Conservancy – TNC Brasil

 

22 de novembro – “Estratégias de proteção das Unidades de conservação e preservação florestal para o alcance do Acordo de Paris”

Alexandre Gaio – Promotor de Justiça no Ministério Público do Estado do Paraná, presidente da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa)

Daniel Pinheiro Viegas – Procurador do Estado do Amazonas, Chefe da Procuradoria do Meio Ambiente

Caroline Prolo – Mestre em em Direito Ambiental pela University College London, fundadora da Latin American Climate Lawyers Initiative for Mobilizing Action (Laclima)

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