As enormes inundações que atingiram a região Nordeste do Brasil em maio de 2022 foram tornadas mais prováveis e cerca de 20% mais intensas devido à emergência climática. O grande impacto humano e econômico foi agravado pelo número de pessoas vivendo em áreas em risco de enchentes e deslizamentos de terra, bem como pela distância entre o alerta precoce e as ações.
Estas são as principais conclusões de um rápido estudo de atribuição feito por uma equipe internacional com mais de 20 cientistas de Brasil, Dinamarca, França, Alemanha, Holanda, Reino Unido e Estados Unidos sob a liderança da rede World Weather Attribution.
Tic, tac: quanto tempo resta ao mundo para controlar o aquecimento global?
No final de maio, os estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas e Sergipe viram quantidades invulgarmente grandes de chuvas fortes. Em menos de 24 horas, algumas regiões experimentaram cerca de 70% da quantidade total de chuva esperada para o mês inteiro. As chuvas fortes causaram deslizamentos de terra e inundações repentinas, levando a 133 mortes e mais de 25.000 pessoas desalojadas.
Para avaliar a influência da emergência climática – causada por atividades humanas como o uso de combustíveis fósseis e o desmatamento – sobre as chances desta chuva extrema acontecer, e sua intensidade, os cientistas analisaram dados meteorológicos e simulações computadorizadas para comparar o clima como ele é hoje – cerca de 1,2°C mais quente desde o final do século XIX, com o clima do passado, seguindo métodos revisados por pares.
Maior intensidade
Os cientistas analisaram os níveis de precipitação durante períodos de 7 e 15 dias na região mais afetada, uma área que abrange as áreas costeiras dos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas.
Eles descobriram que a emergência climática causada pelo homem tornou a chuva mais provável e mais intensa, embora ainda seja um evento raro no clima de hoje, com apenas uma chance de 1 em 500 a 1 em 1000 de acontecer em um único ano.
Os autores estimaram que a chuva foi cerca de 20% mais intensa do que teria sido sem o aquecimento causado pelo homem, embora não tenham sido capazes de quantificar o quanto a emergência climática fez com que o evento fosse muito mais provável devido à falta de registros climáticos locais em longo prazo e limitações nos modelos climáticos, que não são capazes de simular com precisão os eventos naquela região em tão pequena escala.
Os alertas feitos pelo novo relatório do IPCC
“O episódio de chuvas fortes que causou a maior parte dos impactos aconteceu contra o pano de fundo de uma estação úmida relativamente intensa. Foi um evento raro, mesmo sob o clima de hoje, mas à medida que o planeta aquece, podemos esperar ver eventos mais incomuns se tornarem mais frequentes”, explica Thiago Luiz do Vale Silva, meteorologista da Agência de Águas e Clima de Pernambuco (APAC).
A análise também constatou que a chuva extrema causou mais danos porque muitas pessoas estavam vivendo em áreas de baixa altitude propensas a inundações e em encostas íngremes com risco de deslizamentos de terra.
A redução da exposição ao risco desta população, bem como a melhoria das previsões de chuvas fortes e a implementação de ações rápidas de prevenção, podem ajudar a lidar melhor com eventos extremos similares no futuro.
Aumentar a resiliência
“Conforme as cidades crescem, os planejadores precisam encontrar maneiras de diminuir a exposição das pessoas a eventos climáticos extremos e aumentar a resiliência. Um projeto urbano eficaz pode reduzir muito os impactos de chuvas fortes e salvar vidas e infraestrutura, assim como melhorar a eficácia dos sistemas de alerta precoce que levam a uma ação rápida antes de eventos extremos”, defende Alexandre Köberle, pesquisador do Instituto Grantham no Imperial College London.” Estas são ferramentas poderosas para se adaptar às mudanças climáticas e seus impactos associados.”
Os resultados são consistentes com o entendimento científico de como a mudança climática, causada pelas emissões humanas de gases de efeito estufa, influencia as fortes chuvas. À medida que a atmosfera se torna mais quente, ela pode conter mais água, aumentando o risco de chuvas torrenciais. Com mais emissões de gases de efeito estufa e aumento contínuo da temperatura, os episódios de chuvas fortes se tornarão ainda mais comuns e intensos.
“Mais uma vez, vemos como a combinação de eventos climáticos extremos alimentados pela mudança climática e a alta vulnerabilidade da população pode levar a consequências dramáticas”, diz a pesquisadora Friederike Otto, palestrante sênior do Grantham Institute no Imperial College London e líder do WWA. “Os governos no Brasil e no mundo precisam fazer mais esforços para reduzir rapidamente as emissões globais de carbono, mas também implementar estratégias para reduzir os riscos dos impactos climáticos locais. “
(Via ClimaInfo)