O manejo sustentável de açaí nativo ganhou novo parceiro há um ano. O Centro de Referência em Manejo de Açaizais Nativos do Marajó, o MANEJAÍ, passou a apoiar o Projeto Bem Diverso, no Pará, com o objetivo de estimular a sustentabilidade e a biodiversidade nos processos de produção do fruto, assegurando os modos de vida das comunidades tradicionais e agricultores familiares, além de gerar renda e melhorar a qualidade de vida dos povos das florestas.
De lá pra cá, mais de 404 produtores foram capacitados para realizar a socialização do manejo de mínimo impacto de açaizais nativos no Marajó e difundir o uso da prática sustentável para produção de açaí. Do total de extrativistas treinados, 80% já fazem uso da prática de manejo para produção em pequenas áreas e alguns já realizam a capacitação de outros membros da comunidade.
A Técnica do MANEJAÍ, Tecnologia de Manejo de Mínimo Impacto, foi desenvolvida pelos técnicos da Embrapa José Antônio Leite e Silas Mochiutti e já possibilitou o aumento de 30% na produção do fruto. Antes dela, com a valorização açaí, os produtores passaram a ignorar a biodiversidade local e dar atenção apenas à produção da espécie. Com isso, as outras árvores e plantas foram sumindo, e os açaizeiros diminuíram a produção.
Leite explica que o açaizeiro precisa de biodiversidade para produzir: “Especialmente das árvores folhosas e madeireiras para trazer nutrientes do fundo do solo para a superfície, onde o açaizeiro tende a se alimentar”. Segundo ele, com o aumento da biodiversidade por meio da técnica de manejo sustentável, a capacidade de produção das comunidades pode passar de uma para seis toneladas de açaí.
Legado
O técnico da Embrapa vê a Tecnologia que desenvolveu como um legado. “Não queríamos que os benefícios fossem só durante o tempo de vigência do Projeto Bem Diverso e, com o MANEJAÍ, eles podem continuar prosperando. Hoje, os facilitadores que treinamos já conseguem treinar outras pessoas da comunidade. O projeto pode acabar, mas eles seguem trabalhando”, explicou Leite.
Para a capacitação, os técnicos e pesquisadores viajam até as comunidades, levando informações sobre o manejo de mínimo impacto aos líderes comunitários e agroextrativistas da região. Os membros do MANEJAÍ recebem um kit com mochila, ferramentas e uma cartilha com todas as orientações sobre práticas sustentáveis de condução do manejo e de distribuição das espécies nativas que são consorciadas com o Açaí, uma das espécies nativas prioritárias do Bem Diverso..
“Na Comunidade Santo Ezequiel Moreno, onde trabalho, posso falar com propriedade que este projeto veio contribuir e continua fazendo a diferença na vida do povo”, ressalta a professora Sueli Tavares, uma das lideranças do Centro de Referência, localizado na Comunidade Santo Ezequiel Moreno, município de Portel (PA).
A professora explica que hoje as famílias têm uma produção melhor e mais facilidade em extrair o açaí, aumentando assim a produção e a renda. A professora conta que a partir dele é possível perceber grande diferença na garantia de produção e no prolongamento da safra.
Os resultados do MANEJAÍ refletem-se em outras ações na comunidade. Ele foi inserido no currículo escolar e envolve todas as famílias. Segundo Sueli, os alunos, crianças e jovens, passaram a fazer parte do projeto ao participar das palestras e formações e se interessar em cuidar das áreas manejadas.
Educação ambiental
“Do envolvimento deles no MANEJAÍ, surgiu a ideia de elaborar um projeto de manejo sustentável na escola. Escolhemos a área, e eles já fizeram todo processo de preparação no espaço. Hoje, alguns desses jovens já sabem como fazer um manejo de forma adequada e administram seus trabalhos”, conta a professora Sueli Tavares. “O MANEJAÍ está sendo muito importante na vida do povo das comunidades”, relatou.
A viabilização de crédito aos extrativistas também é uma preocupação do Projeto Bem Diverso que se uniu ao Banco da Amazônia e ao Instituto Conexsus para oferecer formação de ativadores de crédito socioambiental. As pessoas que participam dos cursos passam a ter a responsabilidade de levar o crédito rural do Banco da Amazônia para cadeias de valor da sociobiodiversidade da região por meio dos Ativadores de Crédito Sustentável.
No âmbito do MANEJAÍ, também é realizado um trabalho de pesquisa que estimula os alunos do Programa de Educação Tutorial de Engenharia Florestal (PET Florestal) da Universidade Federal Rural da Amazônia a trabalharem como pesquisadores na busca de soluções que façam a diferença na vida de quem produz açaí.
Outra parceira nesse trabalho é a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater). A a seção paraense da instituição trabalha com o projeto desde a sua fundação. “Levamos conhecimento para a comunidade, e ela avança na ideia de manejo florestal com excelência”, explica o supervisor da Emater regional do Marajó, Alcir Borges.
O supervisor é muito orgulhoso do trabalho que a comunidade consegue fazer sozinha a partir dos conhecimentos adquiridos. “O protagonismo dos extrativista é muito importante e motivo de alegria para nós. Pois não queremos ser tutores, queremos que cada comunidade tenha independência”, explica Alcir.
Ele explica que o MANEJAÍ aborda o Marajó a partir do grande potencial que ele tem e mostra que, quando as políticas públicas chegam ao local e são desenvolvidas de forma séria, os resultados aparecem. “Com o MANEJAÍ, a comunidade desenvolve a metodologia do manejo, otimiza a produtividade do açaizais, a produção de renda e faz a política acontecer”, conclui.
Bons resultados
Os resultados alcançados no primeiro ano do MANEJAÍ são motivo de comemoração para o Projeto Bem Diverso, realizador da iniciativa junto aos ribeirinhos e lideranças do arquipélago do Marajó. “Hoje, com o MANEJAÍ, temos centenas de agroextrativistas que geram renda para suas famílias e comunidades ao mesmo tempo em que nos ajudam no trabalho de restauração e conservação da biodiversidade. Isso é gratificante”, comemorou o coordenador técnico do Bem Diverso e pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Anderson Sevilha.
O pesquisador conta que o MANEJAÍ trabalha o desenvolvimento das pessoas e que, nas visitas de campo, ouvem das lideranças locais que elas tinham ciência da riqueza do Marajó, mas faltava valorização. “O retorno que recebemos é de que o MANEJAÍ chegou para que todos possam viver melhor e para garantir o desenvolvimento dos territórios”, ressaltou.
As atividades do MANEJAÍ se desenvolvem no Território da Cidadania Marajó do Bem Diverso, que compreende os municípios de Breves, Curralinho, Melgaço, São Sebastião da Boa Vista, Cachoeira do Arari, Muaná, Ponta de Pedras, Bagre e Portel.
Pandemia
Para o ano de 2020, estava programada nova etapa do MANEJAÍ. Entretanto, a pandemia do novo coronavírus alterou o curso das atividades, sem perder o foco principal do projeto.
“Neste ano, devido ao sucesso das ações do MANEJAÍ, a intenção era ampliar as atividades e estendê-las a outras regiões do Marajó no Estado do Pará. Entretanto, com a pandemia, nossa prioridade passou a ser a saúde e o bem estar dos nossos parceiros e colaboradores e os planos precisaram ser adaptados. As pesquisas seguiram de forma remota, e nosso foco passou a ser a divulgação de informações sobre combate e prevenção à doença. Estivemos a disposição da comunidade e produzimos máscaras de tecido por meio de multirões nas comunidades, que foram distribuídas aos ribeirinhos do Marajó. Mesmo com a pandemia, o MANEJAÍ não parou e ainda tem muito a realizar”, contou o assessor técnico do PnuD no Projeto Bem Diverso, Fernando Moretti.
O Centro MANEJAÍ é fruto de uma articulação institucional entre o Projeto Bem Diverso (PnuD/GEF/Embrapa), por meio da Embrapa Amazônia, da Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), das Associações do PEAEx Acuti Pereira (ATAA e ASMOGA), do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Portel e da Emater.
O MANEJAÍ conta com uma estrutura física com centro de capacitação, agroindústria, cozinha comunitária, e Unidades Demonstrativas de Aprendizado de Manejo de Impacto Mínimo de Açaí Nativo, Viveiro, Apicultura etc.
(Via ONU News)