Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), conjunto de 17 indicadores socioeconômicos e ambientais estabelecido pelos países signatários das Nações Unidas, em 2015, correm o risco de não serem atingidos até o seu prazo final, no ano 2030. O alerta foi feito nesta quinta-feira, 12 de setembro, pelo secretário-geral da ONU, António Guterres.
“Os desafios que enfrentamos estão se movendo muito mais rápido do que nossa capacidade de resolvê-los. A pobreza e a fome estão em níveis de crise, enquanto os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estão ficando fora de alcance“, observou Guterres, durante discurso voltado aos líderes dos Estados-membros às vésperas da Cúpula do Futuro, que será realizada nos dias 20 a 23 deste mês, em Nova York.
A Cúpula do Futuro precede a Assembleia Geral da ONU. Vai reunir chefes de Estado e governo dos 193 Estados-membros da ONU, além de representantes da sociedade civil, pesquisadores, setor privado e juventude.
O objetivo é adotar acordos que aumentem a cooperação para enfrentar desafios críticos, resolver lacunas na governança global e estabelecer um novo consenso internacional para preservar o futuro.
Entre as questões em discussão estarão a aceleração do desenvolvimento sustentável e a reforma de instituições como o Conselho de Segurança da ONU e o sistema financeiro internacional.
Será criado um documento com medidas de ação conhecido como Pacto para o Futuro. Na abertura da Cúpula, espera-se que os líderes mundiais adotem o Pacto, que incluirá um Pacto Digital Global e uma Declaração sobre as Gerações Futuras.
Leia o discurso do secretário-geral da ONU, na íntegra:
Presidente Nangolo Mbumba, Chanceler Olaf Scholz, Excelências,
Obrigado por nos reunirmos hoje para esta Chamada Global sobre a Cúpula do Futuro.
Faltam apenas alguns dias para a Cúpula do Futuro, mas para chegar até aqui foram necessários anos de trabalho.
Quero agradecer a vocês e a seus governos pelo comprometimento em cada etapa do processo.
Os Estados-membros estão agora nos estágios finais de negociação dos três acordos a serem adotados na Cúpula do Futuro: o Pacto para o Futuro, o Pacto Digital Global e a Declaração sobre as Gerações Futuras.
Meu apelo é para que vocês se esforcem para obter as reformas mais profundas e as ações mais significativas possíveis.
Precisamos de ambição máxima durante esses últimos dias de negociação.
Porque os desafios que enfrentamos estão se movendo muito mais rápido do que nossa capacidade de resolvê-los.
Conflitos ferozes estão causando um sofrimento terrível.
Profundas divisões geopolíticas estão criando tensões perigosas, multiplicadas por ameaças nucleares.
A desigualdade e a injustiça corroem a confiança e alimentam o populismo e o extremismo.
A discriminação, a misoginia e o racismo estão assumindo novas formas.
A pobreza e a fome estão em níveis de crise, enquanto os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estão ficando fora de alcance.
E não temos uma resposta global eficaz para ameaças novas – e até mesmo existenciais.
Nove anos após o Acordo de Paris, a crise climática ainda está se acelerando, e novas tecnologias, como a Inteligência Artificial, estão sendo desenvolvidas em um vácuo ético e legal.
Nossas instituições não conseguem acompanhar o ritmo, pois foram projetadas para outra era e para outro mundo.
O Conselho de Segurança está preso em uma cápsula do tempo; a arquitetura financeira internacional está desatualizada e é ineficaz; e simplesmente não estamos equipados para lidar com uma ampla gama de questões emergentes.
Os desafios do século 21 exigem instituições para solução de problemas do século 21.
A Cúpula do Futuro é uma etapa importante na jornada para construir um multilateralismo mais forte e mais eficaz.
Uma oportunidade de atualizar e reformar as instituições globais, incluindo o Conselho de Segurança e a arquitetura financeira internacional, para refletir e responder às realidades políticas e econômicas de hoje e de amanhã.
Precisamos de um foco renovado na prevenção e na mediação de conflitos – não apenas por meio de negociações e diplomacia preventiva, mas também criando condições para a estabilidade por meio do desenvolvimento sustentável e do respeito aos direitos humanos.
Precisamos conectar as causas fundamentais dos conflitos e reconhecer que a crise climática é um multiplicador de ameaças à insegurança. Precisamos responder à natureza mutável da guerra e atualizar nossas operações de paz de acordo com ela. E precisamos de um acordo sobre a mitigação dos riscos do emprego de novas tecnologias para alimentar conflitos.
Da mesma forma, precisamos de reformas na arquitetura financeira global para que ela corresponda à economia global de hoje e seja adequada para enfrentar os desafios atuais.
As instituições financeiras globais devem apoiar os países em desenvolvimento a se livrarem das dívidas e investirem no desenvolvimento sustentável e na ação climática.
Precisamos aumentar drasticamente a capacidade de empréstimo dos bancos multilaterais de desenvolvimento e mudar seu modelo de negócios, para que eles possam ajudar os países em desenvolvimento a obter muito mais acesso ao financiamento privado a taxas acessíveis.
E precisamos de maneiras para que os governos, juntamente com as empresas de tecnologia, o meio acadêmico e a sociedade civil, trabalhem juntos para gerenciar os riscos apresentados pelas novas tecnologias – incluindo a IA – e garantir que essas tecnologias beneficiem a todas as pessoas.
As Nações Unidas estão em uma posição única para atuar como uma plataforma e um espaço de convocação para as principais partes interessadas.
À medida que os choques globais se tornam mais complexos e perturbadores, precisamos de plataformas de emergência que entrem em ação automaticamente, reunindo os principais participantes de acordo com os protocolos estabelecidos. Não podemos entrar na próxima pandemia ou choque global sem estarmos melhor preparados.
E, de modo geral, precisamos fortalecer o respeito aos direitos humanos e à diversidade cultural. Diante de novos ataques aos direitos e à dignidade de mulheres e meninas, precisamos de ações firmes para acabar com a discriminação e a violência baseada em gênero e remover as barreiras que excluem as mulheres do poder.
Em resumo, precisamos de maior solidariedade global hoje e com as gerações futuras; melhor gerenciamento de questões críticas de interesse global; e uma Organização das Nações Unidas atualizada que possa enfrentar os desafios de uma nova era.
Ao chegarmos ao final das negociações dos três textos, faço um apelo a todos os governos para que garantam que eles sejam os mais ambiciosos possíveis – para restaurar a esperança e a confiança de que precisamos para enfrentar os desafios dramáticos de nosso tempo com um novo consenso global.
Excelências,
A Cúpula do Futuro é uma oportunidade para compromissos de longo alcance sobre a colaboração internacional para um mundo mais seguro, mais sustentável e mais equitativo.
Vamos aproveitá-la.
Peço aos Estados-membros que ajam rapidamente, com visão, coragem, solidariedade e espírito de compromisso, para que os três acordos sejam concluídos.
Vamos aproveitar ao máximo esse marco crítico no caminho para um multilateralismo mais interligado, eficaz e inclusivo para o século 21.
E eu lhes agradeço.
Cúpula do Futuro: Lula convida líderes
Em Brasília, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez, nesta quinta-feira, um chamado global aos líderes para a Cúpula do Futuro. “Chegou a hora de agir, o Brasil está dando novo impulso à reforma da governança global na sua presidência do G20. Mas esse debate também precisa ser travado na ONU, o fórum mais inclusivo de todos. Gostaríamos que todos fossem à Cúpula do Futuro com a ambição de promover reformas efetivas”, disse.
O presidente brasileiro destacou que a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que será lançada no G20, estará aberta a todos os países da ONU. A iniciativa, proposta pela presidência brasileira do G20, tem como objetivo estabelecer uma aliança global para obter recursos e conhecimentos para a implementação de políticas públicas e tecnologias sociais eficazes para a erradicação da fome e da pobreza no mundo.
A iniciativa estabelece um mecanismo prático para mobilizar recursos financeiros e conhecimento de vários países e entidades internacionais, para apoiar a implementação e a ampliação, em escala global, de ações, políticas públicas e programas efetivos desenvolvidos pelos diferentes países e instituições para o combate à desigualdade e à pobreza. O objetivo é ampliar bases para o desenvolvimento e superação da fome a longo prazo. “Ela nasce da vontade política e do espírito de solidariedade de enfrentar essa chaga que ainda assombra a humanidade”, ressaltou Lula.